(Belo Horizonte, 9.3.2018) – Uma Caravana Agroecológica percorreu o Triângulo Mineiro entre os dias de 05 a 08 de março. Iniciativa conjunta de instituições parceiras NEA-Epamig; Emater-MG; UEMG/Frutal; CIEPS/UFU; Agrovila São Basílio e FEAD, a caravana contou com a participação de agricultores, pesquisadores, extensionistas, professores e estudantes, e visitou comunidades rurais, assentamentos e agricultores dos municípios de Uberaba, Fronteira e Uberlândia.
Dentre as atividades realizadas destaca-se o curso sobre Manejo Agroecológico de Pragas e Doenças, realizado no dia 06 de março, na comunidade de São Basílio, durante a passagem da Caravana em Uberaba. No dia anterior foi realizada uma reunião de pesquisadores e professores do curso de Agronomia das Faculdades Associadas de Uberaba (FAZU). Dentre os assuntos discutidos tratou-se da condução de área com certificação orgânica na FAZU, que produz feijão, milho, abóbora, café e leite orgânicos. De acordo com o professor e coordenador técnico do setor de olericultura da FAZU, Ricardo Moreira de Mendonça, “a proposta de interação de pesquisadores que atuam com sistemas de produção alternativos pode contribuir com toda a comunidade de Uberaba e região, já que temos a pretensão de expandir esta ação” disse. Por essa razão, pleiteia a inclusão da faculdade no itinerário da Caravana nos próximos anos.
A aproximação, fortalecimento e integração dos grupos de agroecologia no Triângulo Mineiro, por meio da realização de intercâmbios e troca de saberes, foram os principais objetivos da caravana. O estímulo à interação entre pesquisadores, extensionistas, estudantes e agricultores corresponde à tentativa de unir as pessoas que trabalham com a abordagem agroecológica.
A realização de caravanas constitui uma das principais estratégias adotadas pelo movimento agroecológico, e pretende, entre outros objetivos, identificar experiências de produção agrícola exitosas, a fim de demonstrar que é possível produzir sem agrotóxicos. A modernização da agricultura no Triângulo Mineiro, que teve início na década de 1970, a partir da incorporação das áreas com vegetação original de Cerrado, efetivou-se por meio da adoção do pacote tecnológico da Revolução Verde e repercutiu na ocorrência de impactos ambientais marcantes, como resultado do monocultivo e do uso intensivo de adubos químicos, agrotóxicos e mecanização.
No município de Fronteira, os integrantes da caravana conheceram a experiência de sucesso na produção de orgânicos da família do agricultor Leonardo Lucas de Morais. Leonardo conta que durante 16 anos sua família trabalhou com a horticultura convencional, utilizando muito veneno, até que seus pais conheceram a agricultura orgânica em um curso sobre tomate orgânico e decidiram parar de usar agrotóxicos. “Eles buscaram esta alternativa porque perceberam que eram dependentes do uso de veneno, controlavam uma praga e em seguida aparecia outra. A mudança foi um grande desafio, a fase de transição, com análises e papelada, mudanças no manejo, não foi fácil”, conta. Há quatro anos a propriedade foi certificada para produzir alimentos orgânicos. Hoje, toda produção é vendida para a Comunidade que Sustenta a Agricultura (CSA), formada por consumidores de Frutal com acompanhamento dos Técnicos da Emater, Oeder e Juliana e dos professores Vanesca Korasaki e Jhansley Mata, da UEMG.
A Caravana também visitou as comunidades agroecológicas de Douradinho e Carinhosa, em Uberlândia. Conheceu o trabalho do agricultor Jerônimo de Souza Pugas e sua esposa Catarina Pugas, que iniciaram a produção de hortaliças orgânicas a partir do projeto Mandala, há oito anos. Com o incentivo da professora Cristiane Betanho e de um grupo de estudantes (CIEPS / UFU), em 2012, ele iniciou a transição para o sistema agroflorestal orgânico. “Começamos a plantar árvores com frutas e verduras. Não acreditava, mas está dando certo. Enquanto as árvores não crescem, colhemos e comercializamos as hortaliças. A partir do momento que há o sombreamento continuamos apenas com a produção das árvores e frutas. Produzimos as hortaliças numa área mais ensolarada”, explica. Ele lembra que no início a comercialização era difícil e ocorria a partir da divulgação informal. “Agora produzimos dentro da demanda para vender na feira da UFU aos sábados. Hoje, tem mais gente para comer do que conseguimos produzir”, comemora.
Também comercializam nessa e em outras feiras de Uberlândia o agricultor Nei, Alcemo e sua esposa Fátima, José Rúbens e sua esposa Duda, do Assentamento Carinhosa. Durante a visita à propriedade de José Rúbens e Duda, os participantes da caravana puderam conversar com o casal de consumidores Bruno e Fernanda, que destacou os benefícios para a saúde decorrentes do consumo de alimentos livres de agrotóxicos. Os pesquisadores da EPAMIG, professores, bolsistas e estudantes que participaram da caravana afirmam que aprenderam muito além das questões técnicas relacionadas com a produção de alimentos saudáveis, resistência das plantas às pragas e doenças em função da biodiversidade, da riqueza e transformação dos solos por intermédio dos adubos verdes. “A experiência também foi uma oportunidade de vivenciar o dia a dia de famílias que trabalham nessas terras há mais de dez anos, com poucas oportunidades, e que somente agora poderão ser reconhecidos como assentados da reforma agrária. As trocas de experiências entre instituições de pesquisa, universidades e agricultores evidenciam que os agricultores são “Agricultores Experimentadores”. Quem mais aprende são os que têm a oportunidade de conhecer as experiências de produção agroecológica. Também nos mostra que, por vezes, a pesquisa caminha distante dos agricultores, e o quanto a aproximação e troca de saberes é necessária”, disse a pesquisadora Juliana Simões.
Curso de Agroecologia
As pesquisadoras Madelaine Venzon e Wânia dos Santos Neves abordaram a temática do Manejo Agroecológico de Pragas e Doenças durante curso realizado na comunidade de São Basílio, em Uberaba. Estiveram presentes mais de 100 pessoas entre agricultores, estudantes e pesquisadores.
A horticultura convencional é a atividade predominante na comunidade São Basílio. 25 agricultores comercializam cerca de duas toneladas de produtos, a cada dia de entrega, por intermédio das Centrais de Abastecimento (Ceasas) de Uberaba e Uberlândia. De acordo com o secretário da Associação dos Moradores e Produtores de São Basílio e produtor de hortaliças, Abílio Costa Santana Nasser, os agricultores estão buscando conhecimentos sobre práticas agroecológicas, já que muitos têm o interesse de produzir alimentos orgânicos. “Este curso, com todo conhecimento gerado pela pesquisa, é muito bem vindo”, salienta.
Durante o curso, a pesquisadora Wânia dos Santos Neves detalhou aspectos relacionados com algumas doenças encontradas nas hortaliças da Comunidade São Basílio, enquanto sugeriu práticas de manejo capaz de evitá-las. A pesquisadora encontrou nas folhas de alface algumas manchas causadas pelo fungo cercospora. Ela explica que a mancha se expande diminuindo a área fotossintética da planta o que afeta a sua produtividade. “A prevenção começa desde a escolha da semente. Já o tratamento pode ser feito com extratos de plantas que não deixam a doença desenvolver”, sugere. A incidência de doenças de solo, causadas por fungos, bactérias e nematóides, também foi confirmada na comunidade. “Identifiquei uma doença de solo causada por um nematóide que se alimenta da raiz das plantas e impede a absorção de nutrientes do solo e de água. O problema reflete na parte aérea com amarelecimento da planta”, explica. Para reduzir a população de nematóide no solo, ela sugere a rotação de culturas, incorporação de matéria orgânica no solo, dentre outros métodos.
Na avaliação da pesquisadora e coordenadora do Programa Estadual de Pesquisa em Agroecologia, Madelaine Venzon, os agricultores reconheceram medidas de controle, organismos benéficos e técnicas simples que podem ser usadas para diminuir o uso de agrotóxicos: “Um dos problemas que esses agricultores têm é saber como controlar as pragas e doenças utilizando apenas produtos que são aceitos pelas certificadoras. Apresentamos o controle biológico, dentre as técnicas que podem ser utilizadas, como sugestão para que eles possam diminuir o uso de agrotóxicos. Foi uma oportunidade de explanar sobre as relações na natureza e como podemos aplicá-las na agricultura para controlar pragas e evitar doenças causadas por microorganismos”.
Além do Triângulo Mineiro, a Caravana agroecológica já percorreu o Sul, o Norte de Minas e a região metropolitana de Belo Horizonte. A caravana agroecológica para a Zona da Mata está prevista para o mês de abril, e em seguida participará do IV Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), em Belo Horizonte.